sábado, 22 de novembro de 2008

Fantasia na Rua...


Levar a fantasia à rua, deixar contaminar a vida com pequenas ficções, como que um convite a realidades outras menos chapadas e marcadas pelo sempre o mesmo dos dias. Um sempre o mesmo acelerado, cheio da pressa e do não tempo, tornando o olho menos sensível a cada pequena poesia dos espaços e dos outros.


Fantasiar-se as ruas, permitir-se ao fantástico, fora do carnaval... habituar-se ao não medo de quebrar com a nulidade de transeunte e acontecer mesmo aos olhos dos outros... bem como ser permeado pelas mais diversas leituras e permear a vontade de ler o que o olho vê e os ouvidos ouvem.


Cada lugar, um diferente mundo fantástico se criou.

No Largo 13 de maio, a reação em massa... gritos e anúncios e bolos de gente em volta, indagando provocando, cutucando... de raiva a emoção e apego... Todas as idades homens e mulheres, num envolvimento como o de torcida de futebol, entoando hinos e elegendo heróis.



No Parque Ibirapuera, o despertar das crianças, fomos brincados qual brinquedos, compusemos o fantasiar dos pequenos, que nos locomoverem e escolheram por nós nossos destinos.





Na Paulista... os diferentes caminhos nos levaram até um homem-mago, que desvendou em nós signos que nós nem sequer imaginávamos... de olhar penetrante e voz profunda, nos traduziu e traduziu um mundo de possibilidades, um mundo esperando interpretação e troca... De repente, a Miss era a Babilônia, o Mergulhador era o Dragão e a Noiva a Dama de Branco... Apocalipse feito em terra.


Um olhar mais demorado e apurado é o que se pode ter nessas saídas, atraindo os seres mais interessantes a se mostrarem na luz. Nossa fantasia aos olhos dos que nos vêem e nossos olhos vendo a fantasia nos outros. Fato. Há muito. Há tanto...

alguns focos de incêndio

Fui assistir à Homem Cavalo & Sociedade Anônima da Cia. Estável. Uma peça criada e apresentada num albergue público, o Arsenal da Esperança. Uma peça num albergue... descrição primeira que poderia ser a mesma ao trabalho do Trecho agora e no ano passado e que também poderia ser a mesma ao trabalho da Cia São Jorge em As Bastianas...
O espetáculo propõe uma linguagem absolutamente distinta da nossa, mas estar diante daquele elenco, em movimento naquele espaço, me fez ter uma sensação muito potente de que existe uma inquietação compartilhada, que está reverberando de maneiras distintas em uma série de locais e pessoas. O percurso que levou a Estável até aquele lugar é absolutamente diverso do Trecho que é também absolutamente diverso da São Jorge... entretanto, essa mesma vontade, a de atravessar fronteiras institucionais e de sair do espaço "autorizado" do teatro nos espelha. Para além do interesse específico em uma arte que evada a sala de teatro, há essa proposta de criar em relação, há essa necessidade de buscar encontros e de encontrar um olhar menos permeado pelos limites institucionais.
Esses três exemplos que coloquei acima são apenas alguns dentre muitas outras propostas e experiências desenvolvidas em diversos lugares do Brasil e do exterior.
Fui assistir à Homem Cavalo & Sociedade Anônima da Cia. Estável e saí revigorada... fortalecida... sentindo que existe, para além de minha iniciativa pessoal, um movimento acontecendo, que me parece uma reação comum... uma mesma rejeição às imposições espaciais e, logo, relacionais da estrutura social. E esse movimento novo e velho (por estar repleto de experiências já desenvolvidas no passado), essa nova tradução de intervenção, parece quase que ainda nem ter os termos de análise desenvolvidos... está ocupando mais o lugar da indagação do que da lapidação do já consolidado... abrindo um universo de possibilidades...
O que cada um desses trabalhos gera está, claramente, bem localizado... mas as propostas são tantas, são tantos os pequeninos focos de incêndio, que talvez, e vejam, talvez, estejamos diante de um possível descongelamento...

Teatro que se faz junto.


Dando os passos em direção a proposta de realizarmos a peça junto aos alunos do Núcleo Santo Dias... as aulas seguem cada vez mais fluidas e produtivas. Montamos junto com eles - Alemão, Zé Luis, Marcelinho, Walternei, Paulinho, Bruno... - um jogo de improvisação a partir do conto "O Embondeiro que Sonhava Pássaros" de Mia Couto e apresentamos no aniversário do mês do outro albergue da rede, a Pousada da Esperança e no sarau do próprio Núcleo.


Foi muito bonito, os alunos diante do público e todos os novos sentidos e intensidades que isso gera e nós, conseguindo de fato contar histórias junto com eles...


Um começo, novelo de lã desenrolando. Estamos mais certos de ser esse o caminho.


Mais caminhar... Transitando em Camaleão...

Após Blumenau, que certamente foi um marco na história do grupo, continuamos nossas pesquisas aqui na cidade grande São Paulo.
Diante de outras necessidades, Luísa segue em outros rumos, continuando a nos observar de perto, mas não de dentro. Entra para o grupo Tatiana Heide... novos ares, outra energia. Ela já nos acompanhava a um tempo, e foi nossa assistente em Blumenau. Hoje, partilha conosco a caminhada e as descobertas e as perguntas. Salve!

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Nós no AMBLU.

Ou

A Poesia na relação

Ou

O teatro para além do instante


Assim que decidimos nos inscrever ao festival, fomos atrás de descobrir se havia algum albergue ou abrigo em Blumenau, descobrimos o AMBLU e nós mesmos ligamos para ver se havia interesse no nosso trabalho e a aceitação foi imediata. Mandamos a proposta e passamos.
Para chegar ao abrigo do centro da cidade, o percurso é longo. E nesse percurso a mudança de cenário é radical. As casinhas alemãs, as ruas limpas, os canteirinhos de flor vão desaparecendo, aos poucos, morros e mata, casas cada vez mais dispersas, sem constituir um corpo urbano, casas cada vez mais pobres, barracos de madeirite. Subimos uma ladeira bastante íngreme e, enfim, isolado numa montanha, está o abrigo. E quando saltamos do carro, os rostos que nos observam são muito próximos dos rostos que encontramos no SAMIM e nos outros albergues nos quais trabalhamos. Afinal, a marginalidade é a mesma e a exclusão e isolamento também. Se nas ruas vemos muitos brancos e loiros e quase nenhum negro, no abrigo víamos os rostos mais diversos, eles estão lá sim, também existem naquela cidade, mas afastados, periféricos, sem macular o quadro vivo da pequena Europa no Brasil do centro de Blumenau.


O abrigo é de uma força quase que arrebatadora. Cercado de uma natureza exuberante, o terreno é grande, mas os aposentos minúsculos. Pequenas casas. Pequenos espaços. Pequenos universos: o dormitório, o refeitório, o salão de belezas, a horta, o varal, os carrinhos mágicos de um morador de rua que fez universos líricos sobre rodas... Um funcionário nos conduz por aquele espaço, bastante envolvido em poder fazer aquele local saltar aos olhos de outros. Antigamente, ao que contou, o local fora um prostíbulo. Pouco abaixo da montanha, um córrego, já totalmente poluído... podia-se ouvir o som da água.


Enquanto conhecemos os espaços, vamos nos apresentando às pessoas e contando sobre o espetáculo que queríamos montar lá e apresentar para público de fora no período de uma semana. Conhecemos rapidamente Mara Lúcia e Sônia. Deitadas no quarto, risonhas e conversadeiras. Mulheres fortes que se apresentam a nós com a intensidade de saber de si, com uma voz que se apresenta e que nos quer conhecer. Elas rapidamente se envolvem pela idéia e, enquanto jantamos juntos, nós a convidamos a participar da peça, com a total liberdade de elas fazerem o que quiserem e elas aceitam e ficam muito animadas, já inventando as possíveis fantasias que construirão conosco. Mara Lúcia decide ser dama de honra da noiva, já inventando na hora falas e canções. Sônia nos conta que já fez teatro e decide fazer a cigana da história da Miss.
Fora as duas, que já de saída nos abraçaram, houve outros que se envolveram de forma mais discreta, distante, crianças e velhos... e houve aqueles que, tranqüilos, deixavam-nos estar ali e criar ali... e houve também os desconfiados. E nós, impossibilitados de fazer um processo destrinchado, de maneira nenhuma de qualquer forma nos impomos a eles... sempre muito respeito, afinal, as vidas daquelas pessoas, sabemos, são muito imensas e merecem a maior admiração. No geral, de qualquer maneira, receberam-nos muito bem e aceitaram o que propúnhamos com tranqüilidade. Os funcionários, inclusive, gostavam da idéia de que outras pessoas pudessem ver o abrigo, conhecer o espaço.


Diante da intensidade daquele local, decidimos mudar a estrutura da peça e a fazer em deslocamento pelo espaço, itinerante, num formato totalmente diferente do que estávamos habituados. Aquele espaço gritava por outras descobertas que nós teríamos pouco tempo para assimilar... Criamos, pois, um roteiro que brincasse pelas vielas e pátios do AMBLU.


Dia seguinte, de ensaio, encontramos Sônia toda arrumada em cigana e já havia criado para si um espaço, bola de cristal em caixa de pizza... surpreendemos-nos um tanto... nunca alguém tinha se entregado tão rapidamente a nós... que alegria poder despertar essa vontade do jogo, essa vontade da ficção, adormecida em Sônia.
As pessoas do albergue nos acompanham no ensaio geral. Mara Lúcia se envolve totalmente no jogo e Sônia de improviso, entra também em outra cena como a dona do bar. Os moradores do albergue nos acompanham no ensaio. Como se fosse apresentação. Aplauso no fim e tudo. Fala de Mara Lucia: eu sei do que vocês tão falando. Dos sonhos que a gente tem e que não conseguimos realizar. Eu sei do que vocês tão falando.


Temos que fechar tudo muito rápido, pouco tempo que temos para ensaiar, ainda mais mudando radicalmente a peça, experiência que nunca tivemos antes, por sempre habitar um bom tempo o espaço de apresentação e convivendo com as pessoas... Dessa vez, foi tudo muito rápido e também muito intenso, laços que depressa já se formaram, nessa criação-relação artística, sim, mas muito íntima e direta, nós diante deles, eles diante de nós.


As apresentações correm bem com eles, dia a dia o trabalho cresce... conseguindo cada vez mais jogar com eles. Além de Mara Lúcia e Sônia, existem muitos outros, que mais como espectadores também se aproximam de nós, travando uma relação rápida e intensa... uma mãe com filhas pequenas... um senhor de pé machucado... um homem de palavras curtas e duras... um tanto de pessoas...


Os funcionários dizem a nossa orientadora que acham ótimo que Mara Lúcia e Sônia estavam fazendo a peça conosco, que as duas estavam animadas, mais seguras e envolvidas. Sônia nos diz que depois que a gente for embora ela vai organizar uma peça com os moradores de lá na qual eles possam contar suas vidas. Que seria um jeito do mundo os ouvir... Ficamos mais do que felizes. Afinal, sim, esse trânsito inusitado, qual um respiro no espaço, pode sim gerar pequenos brotos...
Damos fotos nossas com eles a cada um que estava mais próximo... difícil despedida de afetos que se criam rápidos, quando a poesia ajuda a dissolver as muralhas duras das relações cotidianas. Agradecemos-nos mutuamente, eles e nós transformados e certos de termos vivido verdade e de termos nos encontrado inteiros e respeitosos, de termos conseguido atravessar fronteiras que as estruturas nos impõe.
Hoje, votos para que o trecho siga rumo a melhores e outras paragens... e que a poesia possa coexistir na vida deles, bem como suas vidas coexistiram em nossas poesias.

Sobre o Festival Internacional de Teatro Universitário de Blumenau

Ou

Elucidações sobre o Panóptico

Ou

A Descoberta da Marginalidade

Ou

Sobre a Existência de Ilhas

Ou

Acerca da Moral Entre os Homens


Iremos nesse texto propor algumas perguntas, mais do que respostas. Por que é exatamente esse nosso caminho, o do questionamento, mais do que do resultado pronto... de estarmos de mala nas costas, sapatos e pé na estrada, mais do que construindo morada ou restaurando a velha casa.

Antes de mais nada, adiantamos que o festival foi absolutamente necessário para nos dar a certeza do rumo que escolhemos, bem como de entender que de fato, estamos diante de uma rigidez das formas, uma rigidez em muito aleatória, que pode ser amolecida ou questionada... Entendemos também que devemos ter mais cuidado. Afinal, os homens estão tão distantes um do outro que, se forem sair de seus pequenos mundos, precisam de todo um preparo para entrar em relação. Precisamos ser mais convidativos e suaves, mais condutores, para que os processos possam se encadear de maneira mais tranqüila, reverberando para além da rejeição.

Polêmica. Sim, isso que o trabalho gerou. Desestruturação e polêmica. A ruptura, que o grupo propõe como eixo fundador, ocorreu de maneira muito mais intensa no próprio festival do que no albergue.
Participamos de um julgamento, no qual nós, réus, havíamos cometido crimes, crimes morais e artísticos. Em nenhum momento, por exemplo, nas discussões geradas pela peça se comentou de outros projetos muito análogos ao nosso como o da Cia. São Jorge e "As Bastianas", como se o que tivéssemos propondo fosse algo impossível, ingênuo e equivocado, que não pode ser... como se nunca tivesse havido.
A verdade é que mal se falou da peça. O que de fato incomodou e provocou foi ter entrado naquele local, foram aqueles homens diante daquele local, foi o real batendo na cara e o que nos disseram foi, "não, não devemos nos relacionar assim, diretamente com o real".
Diziam apenas que éramos bons atores e paravam por aí, porque essa não era a questão. Por que essa não era a questão... nesse caso, julgamos nossa intervenção no festival (por que é assim que deve ser chamada), extremamente frutífera, foi o único debate em que não entrou em questão os pormenores do fazer teatral... o único debate em que se falou de vida. Alguns nos criticaram dizendo que o abrigo era mais forte do que nós e a isso, nossa resposta era "que ótimo".
Acusaram-nos de expor aquelas pessoas... Primeiramente, todas estavam perfeitamente cientes, e, no momento em que nos acusa, está menosprezando o poder de escolha delas, está necessariamente as acusado de inconsciência. Se ela quis se apresentar conosco, se quis se mostrar visível, nós, enfim, não deveríamos abrir espaço? E você, público externo, não deveria considerar que a exposição talvez seja almejada, em uma vida de exclusão e invisibilidade? Ou, será, não foi você público externo que se sentiu exposto e despreparado, quiçá envergonhado de ser visto por aquelas pessoas, uma vez que, dentro de um espaço que é muito mais delas do que vosso, elas não precisam se anular e se esconder no meio da paisagem urbana?
Diziam-nos também que não deveríamos contar a história deles, nesse momento, alertamos, "são contos de Mia Couto"... eles nos respondem, "mas tem a ver com eles"... e não deveria ter? E por que razão eles deveriam nos assistir? Logo depois dizem, "não, mas vocês são diferentes demais deles, são outros corpos, são outras vozes"... ah, mas então porque iríamos lá se não fôssemos trazer nada de novo?
Comparavam o tempo todo o espaço com hospitais e hospícios e seus freqüentadores como doentes, foi então que ficou claro, eles não tinham idéia do que era um albergue, morada provisória em tempos de instabilidade. E, hora, desabrigados são necessariamente doentes mentais? Foi assustador o quão distante aquele mundo era daquele público.
Propunham-nos um trabalho assistencialista, de apresentar uma peça só para eles, e fazer pesquisa de campo e apresentar fora dali, quiçá na rua. E não seria nesse caso que eles seriam também explorados? Tendo sua vida utilizada sem que eles pudessem de fato aparecer e falar conosco? E que transformação de espaços e novo fluxo estaríamos propondo dessa maneira?
Também nos indagavam "e quando vocês vão embora, o que acontece? Como eles ficam?" e nós nos perguntávamos, mas por que deveríamos oferecer essa garantia exata só porque fomos lá? Por que não podemos ser apenas uma passagem, que pode ou não movimentar o lugar em novos rumos? E no teatro de palco, o que acontece com o público que vai embora? Por que nesse caso o ser efêmero é tão mais aceito? Por que aquele público se quiser pode ir em outra peça e o público do albergue não? Ah, então se eles não podem ter acesso sempre eles não devem ter nunca? E, de qualquer maneira, passamos dias lá... não foi assim tão passageiro...
Foram no terceiro dia e disseram que não tinha ninguém do albergue vendo. Primeiramente, muitos já haviam visto tudo e não sentiam necessidade de ver de novo, ficando sentados, observando a nossa passagem... e conversávamos juntos depois que tudo terminava... Depois, haviam sim gente de lá acompanhando... por exemplo uma mãe com duas filhas. Por que elas não foram reconhecidas? Por que não aparentavam ser de rua?
Disseram que estávamos diante de uma questão ética. Não negamos as possíveis contradições do que fazemos. Mas o conflito de classe real gerado daquele encontro não pode ser uma proposta real? E essa moral, essa lei de relacionamento humano, tem fundamento em que? Não devemos então nos olhar de frente, devemos sempre legislar os limites, para não correr o risco de que as coisas mudem de lugar?
Alguns diziam que nosso interesse não era teatro, que não estávamos fazendo teatro, que era na verdade assistencialismo social, ou ação política... Mas quem foi que estabeleceu esses limites, se não tu que nos julga agora? E qual a vantagem de separarmos tudo? Por que não mesclar as fronteiras e se preocupar menos com o resultado artístico e mais com o encontro humano e a desestrutura política? Daí que nos entendemos diante de uma estrutura de Panóptico - centro penitenciário ideal desenhado por Jeremy Bentham em 1791, no qual todos os aposentos podem ser observados de uma torre central, sem que dos aposentos se veja o observador -, que esse grande olho que julga, pune e estabelece os limites já nos é tão natural, que passamos a também legislar e estabelecer limites e punir em nossos meios.

Talvez, de fato, a situação do festival tenha sido demasiadamente artificial para o trabalho... afinal, as pessoas tinham que assistir para, por exemplo, julgar, e não tinham como escolher se queriam ou não ir... Além disso, nesse formato, não preparamos nenhum programa, como havia na primeira versão do SAMIM, o que talvez tenha deixado as pessoas mais carentes de dialogar conosco...

De qualquer maneira, muito mais do que imaginávamos, entendemos o qual de fato as esferas sociais estão fragmentadas e que, para aproximá-las é necessário muita cautela, mais do imaginaríamos.

Além de tudo isso, em meio aos olhares de repressão, haviam aqueles que gostaram e se aproximavam mais como cúmplices, as vezes até em segredo para que os outros não vissem. Dentre as coisas boas que nos disseram, nos iluminaram de que o que estamos fazendo é "realismo fantástico".
.
.
.

Qual a real vantagem na reprodução de formulas perfeitamente aceitas e reconhecíveis? Por que não arriscarmos errar sem nos defender da possibilidade da queda? Por que lustrar o mesmo palco e limpar suas cortinas vermelhas? Que o nosso desejo é abrir mais vazão ao desejo... menos formais e mais diante do outro... buscando essa estrada comprida que não chega a lugar nenhum se não nela mesma... rumando encontros e gerando potencialidades.

Sapato Sujo na Soleira da Porta em Blumenau

Inscrevemo-nos no Festival Internacional de Teatro Universitário de Blumenau e passamos. Inscrevemo-nos da vontade de poder estar no trecho de fato, mala nas costas, propondo nossas rupturas em outras margens, dispersas. O que poderíamos imaginar acerca da repercussão de nosso trabalho em um festival universitário de teatro certamente nem passa perto da experiência vivida. Surpresa diante de uma intensidade arrebatadora. Surpresa diante de nosso deslocamento. O trecho, enfim, independe da viajem, a marginalidade, percebemos só nesse momento, faz parte de nossa espinha dorsal mais primeira. Há em nós o que nos faz estar fora, mais na estrada do que no prédio, e assim, há em nós o que causa desconfiança, receio, reprovação.
Tão surpreendente foi a experiência vivida, que necessitamos de um tempo até organizar um texto a respeito... passou-se quase um semestre inteiro do festival...
A verdade é que o que vivemos duas histórias paralelas nessa viajem, a nossa história junto ao AMBLU (Abrigo Municipal de Blumenau) e seus freqüentadores e funcionários – local onde aconteceu o espetáculo –; e a nossa história junto ao festival propriamente dito.
Tentamos escrever as duas histórias juntas, mas pareceu tão surreal e absurdo, que preferimos descrever as duas histórias separadamente... os dois relatos e impressões seguem nas postagens acima.